Chegadas e Partidas

Por Luíza Fregapani
Acadêmica de Jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina

Chegadas e partidas (The shipping news – EUA – 2001) é um filme sobre um homem em busca de suas origens. Quoyle trabalha em um jornal grande, mas em uma função pouco glamourosa. Seu pai tinha certeza de que ele não seria bem sucedido, e talvez, por acreditar nisto também, Quoyle tornou-se uma pessoa invísivel – como ele se intitula.

O filme tem como base um romance homônimo de Edna Annie Proulx – jornalista norte-americana – que ganhou o seu primeiro prêmio Pulitzer com esta obra em 1993 e o segundo, em 1998, com Brokeback Mountain – que também foi adaptado ao cinema.

Quoyle é um homem frustrado com um emprego medíocre como tipógrafo e é casado com uma mulher geniosa – Petal – que se importa minimamente com ele. Este casamento conturbado, que começa com Petal entrando em seu carro num posto de gasolina após uma briga com o suposto namorado, resulta em uma gravidez inesperada de uma menina chamada Bunny.

Após a morte por afogamento de Petal – enquanto ela fugia de carro com seu novo namorado, Quoyle e Bunny mudam-se, por sugestão da tia dele, para Newfoundland – no Alasca nordeste do Canadá – em busca de suas origens.

A cidade é totalmente voltada para a pesca e por isso todos os personagens do filme possuem uma atração misteriosa pelo mar. Os que não têm raízes locais almejam mudar-se, anseiam por liberdade – e isto torna-se concreto com a idéia de construir um barco e navegar rumo a outro lugar. A morte dos personagens é toda voltada para o mar: todos os que morrem sofrem acidentes de barco, em que se afogam ou desaparecem para sempre.

Newfoundland é bastante misteriosa e os moradores dela são muito sensitivos. Os três, Bunny, Quoyle e Agnis, mudam-se para a casa de seus antepassados, o Quoyle Point, um casarão velho que está desabitado há mais de 40 anos. A casa tem uma história bastante peculiar, e compete com o personagem principal do filme –pois é visível a comparação da casa com os sentimentos do Quoyle.

A família Quoyle é muito famosa no local, e as gerações passadas desta família eram conhecidas por sua astúcia e malícia – eram piratas que enganavam os viajantes, trocando de lugar as referências para os barcos, a fim de criar acidentes e assaltar os naufragos.

Quoyle, apesar de descender desta família, é motivo de chacota por intitular-se “uma pessoa que não gosta de água”. Mesmo assim resolve estabelecer-se na cidade e consegue um emprego de repórter no jornal local, apesar de não ter experiência nenhuma na área. O desenrolar do filme se dá com a melhoria de sua carreira como repórter – Quoyle passa a escrever uma coluna semanal sobre barcos – e a sua integração na comunidade. A manchete criada por ele para este momento é “O bobo da corte espanta a todos surpreendentemente”.

O personagem está mais para um jornalista literário do que um repórter propriamente dito. Em um passeio surge o seguinte desafio: o editor, Jack Buggit, pede a Quoyle que olhe para o horizonte e crie uma manchete. Quoyle diz “Horizonte carregado de nuvens negras” e Jack rebate: “Tempestade iminente ameaça povoado”. Após este passeio, o repórter inexperiente passa a criar manchetes para todas as situações da sua vida – que vão ficando mais sucintas e explicativas ao longo do filme.

Desde o início do filme, Quoyle se pergunta “será que eu nasci na família certa, ou será que existe outra família que realmente me ama, que está a minha procura?”. Em Newfoundland ele tem, não só a resposta para esta pergunta, mas também a recuperação de seu amor próprio.

Quoyle fica responsável pelas “Shipping news” – área do jornal que dá nome ao filme – notícias vindas com os navios que chegam. Um dos colegas de redação de ajuda-o a perceber que na verdade o que se espera dele como repórter é que escreva sobre as histórias por trás das histórias, ou seja, não necessariamente sobre quais navios chegaram e partiram e a qual hora, mas sobre a vida das pessoas que passam por estes navios e o ambiente do cais, por exemplo.

O filme, jornalisticamente falando, trata da busca pelo lado humano da matéria – que é um foco diferente do que os habitantes daquela comunidade estavam acostumados. Em sua primeira cobertura jornalística, é recomendado a Quoyle que fotografe, em um acidente, algo que remeta ao humano – “Uma bota da estrada, uma luva de criança ou uma bolsa de mulher remetem ao emocional” diz seu editor-chefe.

Dirigido por Lasse Hallstrom – diretor sueco, que trabalhou também em Chocolate, o filme é envolto em mistério – e até por que não – suspense, e, como em todos os seus filmes, o diretor busca, da mesma maneira que Quoyle em suas reportagens, o lado humano de seus personagens.

FICHA TÉCNICA

Chegadas e Partidas (The shipping news / EUA, 2001 – 111 minutos)
Gênero: Drama
Direção: Lasse Hallström
Roteiro: Robert Nelson Jacobs, baseado em livro de E. Annie Proulx
Elenco: Kevin Spacey, Julianne Moore, Judi Dench, Cate Blanchett