Mestrando no POSJOR e pesquisador no objETHOS
Ah, o New Journalism… Nascido na década de 60, imortalizado por expoentes como Gay Talese e Trumam Capote, admirado por acadêmicos e jornalistas do mercado, considerado morto e sepultado por estes mesmos profissionais que outrora se fascinaram pelas grandes estórias e hoje cada vez mais insistem em mercadejar as notícias. Perdoem-me a cacofonia, assim como perdoo e cedo à outra face aos que não mais acreditam em grandes reportagens no jornalismo.
Tudo isto me veio à mente no momento em que minha tristeza manifestou-se quando vi a entrevista[1] do meu conterrâneo Fernando Morais; mais um jornalista aparentemente desiludido com a imprensa brasileira e seu menoscabo com grandes matérias. Logo ele, autor de clássicos como “A ilha”, “Chatô, o Rei do Brasil”, “Olga”, “O Mago” e “Os Últimos Soldados da Guerra Fria”. Considerei pertinente refletir sobre o tema, da mesma forma que os soldados refletem sobre a guerra ao ver seu comandante desencantado com as batalhas.
Seria de fato uma utopia pensar em grandes reportagens diante deste jornalismo cada vez mais mercadológico? Talvez, mas não acredito que esta fase esteja sucumbida para sempre, mesmo diante de um cenário jornalístico cada vez mais latente em fazer mais com menos.
Não é de hoje que se fala em uma suposta crise jornalística, esta é tateada principalmente após a expansão da internet como uma nova plataforma de transmissão informativa. Dizem que ela será a responsável se de fato um dia o impresso desaparecer, não creio em nenhum dos dois, pelo contrário, em meio aos jornais cada vez mais enxutos de notícia e transbordando publicidade, vejo na internet um campo propício à disseminação das grandes reportagens.
A meu ver, um dos principais problemas está na busca por um único culpado. Se de fato a grande reportagem está sumindo, um conjunto de fatores são os vilões deste jogo. Basicamente uma grande reportagem necessita cumprir três requisitos: um repórter dedicado e criativo, tempo de apuração e um veículo midiático com espaço para publicação. Deixei propositalmente de lado um quarto item, uma pauta atraente, pois ainda acredito que se o primeiro requisito for cumprido, um buraco de rua pode se tornar uma grande história.
Por mais que a pauta seja simples, cabe ao jornalista procurar aquele ponto crucial de amarração, o detalhe apenas aparente a olhos curiosos e bem treinados. A sorte está lançada, mas aqui não é a roleta ou o sacudir de dados que garantirá o prêmio, e sim a astúcia, o faro jornalístico para enxergar a reportagem onde ninguém mais vê. Em meio à correria cotidiana e demanda excessiva de pautas a se cumprir parece difícil pensar desta forma, porém não é impossível, principalmente em eventos extraordinários e pautas saturando-se. Um exemplo é a reportagem de Sérgio Dávila, para a Folha de São Paulo, durante a cobertura do atentado de 11 de setembro.
Quase um mês depois do ocorrido e inúmeras matérias relatando terroristas, governo americano, vítimas e sequestro dos aviões; o olhar do repórter fez a diferença para encontrar uma nova pauta em meio aos escombros do World Trade Center. A matéria “Falta de sobreviventes ‘estressa’ cães”[2] voltou o olhar dos leitores para a “divisão K-9”, ou seja, retratou o dia a dia dos cães farejadores e suas dificuldades no árduo trabalho de procurar corpos e sobreviventes. Isto ilustra o fato de que, dos três requisitos citados anteriormente, talvez o primeiro seja o mais fácil de ser alcançado por depender exclusivamente do repórter.
Infelizmente, em dias atuais, tempo, espaço e consequentemente a criatividade do repórter ficam suprimidos pelo fazer mais com menos do mercado jornalístico. Seria ótimo se este excesso se referisse a mais qualidade, texto, tempo de apuração, porém é o oposto que se propaga, na ilusão de que menos aprofundamento e mais textos generalizantes, espalhados por editorias desordenadas, são o acompanhamento exato para o prato principal publicitário.
Tentar mudar este quadro, que diretamente se associa com mais peso ao impresso, é praticamente caminhar em círculos. Considerar que estes fatores são os meteoros destruidores da grande reportagem também o é.
Pode ser até plausível que o impresso não mais necessite de grandes reportagens para manter-se daqui um tempo, porém outras mídias como programas televisivos e até mesmo canais de internet não desistirão tão cedo desta riquíssima forma de jornalismo.
Crer que a grande reportagem caminha para o abismo é tão assustador quanto ouvir pessoas dizendo em redes sociais que na falta de jornalismo bom e honesto a sociedade já está se virando muito bem sem ele: os jornalistas é que não aceitam sua inutilidade social.
Desconheço esta sociedade e dentro da minha ignorância prefiro crer que ainda há espaço para o bom jornalismo, de textos grandes ou pequenos,
Fernando Morais, embora descrente da continuidade, acredita que as pessoas querem saber de grandes reportagens, os jornais é que não investem neste modelo. Walter Lippmann, em “A natureza da notícia”, afirma que “um bom jornalista irá encontrar a notícia com mais frequência do que um picareta. Há lances de sorte, mas o número de homens que os consegue é pequeno”.
Assim enquanto o primeiro requisito mantiver acesso na cabeça dos jornalistas, enquanto esta sorte for almejada e o desejo das pessoas a linha de chegada, ainda há um resquício de esperança. Pode faltar tempo de apuração, mas não faltará espaço de publicação. Uma matemática simples onde, se a maioria ganha, dois requisitos alcançados permitem que o outro se forme com qualidade, ainda que não tão rápido como desejamos.
[1] http://tvbrasil.ebc.com.br/espacopublico/episodio/espaco-publico-recebe-fernando-morais
Oi Carlos!
Após refletir lendo seu artigo, decidi compartilhar com você algumas questões. Primeiramente, devo lhe dizer que tenho 17 anos e nessa cansativa época de vestibulares na qual me encontro, decidir ou não cursar jornalismo é uma dúvida que ainda paira sobre todas as minhas questões.
“Gostar de escrever é meio caminho andado”, uma jornalista me disse em uma palestra, dessas que a escola apresenta aos alunos do último ano. Não sei bem se ajuda ao lhe dizer o quanto gosto de fotografia e filmagem, ou se ajuda lhe dizer que sou autora de dois livros publicados e que me classifiquei no CNNP 2014 afim de tentar lhe mostrar o quanto adoro escrever. Porém, como autora, como adolescente, reconheço o pobre mercado de leitores que o Brasil possui. Falta incentivo? Falta amor? Falta reconhecimento? O que há de interessante nos bailes funk e nas redes sociais que substituem tanto leituras como as de J.K. Rowling, PC Cast, Dan Brown e tantos outros contemporâneos? Qual a diferença da liberdade atual e a de 20 anos atrás?
Recentemente ouvi dizer que a média de leituras feitas pelos brasileiros são dois livros ao ano. Uma completa vergonha, penso eu, em um país tão grandioso e rico como o Brasil. Com tamanha grandiosidade, não seria o Conhecimento o mínimo exigido desta nação para sabermos lidar com tantas diversidades encontradas aqui, no nosso quintal?
É uma frustração muito grande ser interessada na escrita, na comunicação e não encontrar coragem para seguir esse caminho que tanto se molda sem avisar e dizer porquê. Sempre fui adepta à opinião de que quando fechamos os olhos para a cultura, nos tornamos pobres, e agora, aqui estamos em míseros dois livros ao ano. Somos uma nação acostumada ao comodismo; aceitamos os erros como normais quase sempre, mas substituímos a expressão “negligência” por “jeitinho brasileiro”, e nos orgulhamos disso, sem fazer nada. Por quê? Não sei.
Sou adolescente e vejo os seguintes fatos: O papel está sendo substituído pela tela, a caneta pelo touch, diálogos por tweets, os livros pela rede. Talvez louca seja eu, que insisto nas páginas ao invés de me juntar aos outros sem questionar, talvez fosse mais fácil assim. Por que, então, insistir no jornalismo?
Relembrando sua própria citação feita por Lipmann, “Há lances de sorte.”. Deveríamos, então, nos acostumar com a sorte de encarar assim mesmo a modernidade? Torcer para que, por sorte, nas batalhas como em livros contra as telas, a leitura em uma tarde de domingo contra a velocidade (que nunca é rápida o suficiente), a modernidade sempre saia perdendo?
Recusar a modernidade seria regredir, mas o que faz a sociedade ao rejeitar grandes leituras? Progresso?
Também não creio nessa sociedade citada por você em que o jornalismo caminha para o abismo, já que informações sempre existirão ao lado da internet. Então por que, Carlos, ao ver a existência desses opostos, eu não deveria sentir medo em me tornar uma jornalista em um mundo cada vez menos feito de papel?
Um forte abraço!
Naély