Amanda Farias
Estudante de jornalismo na UFSC, especial para objETHOS

“Governos em sintonia” era o que estampava a manchete do jornal impresso Diário Catarinense, no dia 17 deste mês, após a passagem do presidente Michel Temer à Florianópolis para palestrar no 90º Encontro Nacional da Indústria da Construção (Enic). Entre os presentes, também estavam o prefeito de Florianópolis, Gean Loureiro (PMDB) e o governador do Estado, Eduardo Pinho Moreira (PMDB). Bem, além destas autoridades serem correligionárias, o que mais está em sintonia nesses governos?

Florianópolis acaba de passar pela greve dos trabalhadores no serviço municipal, que durou 30 dias e foi contra o projeto proposto pela prefeitura para contratar organizações sociais (OS) nas áreas de saúde e educação, aprovado pela Câmara de Vereadores no feriado de 21 de abril, sob forte esquema de repressão policial.

Já os trabalhadores de empresas do Estado, como Ceasa (Centrais de Abastecimento do Estado de Santa Catarina), Cidasc (Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina) e Epagri (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina), representados por 11 sindicatos, aprovaram, no último dia 17 de maio, em assembleia geral unificada, um indicativo de greve. O motivo seria a rejeição à proposta apresentada pelo governo do Estado de reposição zero nos salários e no valor de benefícios sociais. Estas informações foram retiradas do site do Sindaspi/SC (Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Assessoramento, Perícia, Pesquisa e Informações de Santa Catarina) e o portal Notícias do Dia online foi o único a veicular a informação- apesar de utilizar apenas as informações publicadas na nota do Sindaspi.

O governo de Temer, segundo divulgado pelo Datafolha no dia 17 do mês passado, é considerado ruim ou péssimo por 70% dos brasileiros. E, no mesmo dia em que saiu a manchete citada acima no DC impresso, também foram publicadas no DC online as seguintes reportagens “Denúncias contra Temer causaram prejuízo político ao governo, diz Padilha” e “FHC: governo Temer não conseguiu transmitir para o País a confiança necessária” com intervalo de duas horas entre as publicações.

Etimologicamente, sintonia quer dizer “estado das pessoas sintônicas, que se encontram em harmonia ou correspondência com o meio (condição de concordância, equilíbrio)”. Já que na prática não vemos sintonia entre esses governos – além de interesses próprios – e principalmente, entre governo e população. Sendo assim, não há motivos para que o DC fizesse uso do substantivo.

Trago um recorte do lead, primeiro parágrafo, da matéria publicada no impresso:

“A passagem do presidente Michel Temer (MDB) por Florianópolis para abrir a 90º edição do Encontro Nacional da Indústria da Construção (ENIC) foi marcada por sinais de alinhamento entre os governo federal e o governo catarinense, agora sob administração do correligionário Eduardo Pinho Moreira (MBD)”.

Já no portal online, a manchete foi alterada para “Em Florianópolis, Temer anuncia R$ 41,6 milhões em crédito para 7 cidades de SC” e o parágrafo citado acima foi suprimido – e nenhuma outra menção à tal “sintonia”. Sintonia não evidenciada e nem comprovada durante todo o texto da matéria. Sintonia, provavelmente, associada a verba prometida por Temer para investimento em SC – mas que não diminui os impactos negativos de seu mandato em todo o país.

Leitores comentam negativamente

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Ilustração:  Zé Dassilva

Após tais informações, qual a real sintonia entre estes governos? Provavelmente nossas conclusões não são as mesmas que a capa do DC quis passar. Quais interesses o veículo quis defender? Entre as hipóteses entram o interesse do próprio veículo, de seus leitores, de patrocinadores, partidários, entre outros. O DC conhece seu público, talvez tenha passado a mensagem no viés em que eles queriam receber, já que os repórteres responsáveis pela publicação nos dois meios foram os mesmos, Larissa Neumann e Victor Pereira. Também percebendo essa diferenciação do público impresso para o portal online, seja no poder de respostas, conservadorismo, posicionamentos políticos e o leque muito maior de informações, adaptaram as publicações.

Como de costume, o DC sempre publica a foto de suas capas do impresso no Facebook, com pouca repercussão, apenas cinco compartilhamentos. Porém os oito comentários realizados foram negativos à menção de “sintonia”, em um deles, uma leitora diz: “Governo$ em $intonia$. $eiiiii”. Outra publicação de rotina na rede social é a charge do dia, realizada por Zé Dassilva e a publicada neste mesmo dia 17, com mais repercussão, 47 compartilhamentos, às críticas dos leitores se destinou ao Zé, onde o alinhavam a defesa do PT. Bem, em 2060, como a charge faz alusão, ou talvez antes, espero que todos possamos perceber os tempos sombrios pelo qual a política brasileira passou nestes últimos anos – caso ele já tenha cessado.

Por sua vez, o jornal Notícias do Dia, publicou a mesma manchete (“Temer libera R$ 60 mi para SC”) e o mesmo texto no jornal impresso e no portal online. Agregou apenas relatos do evento, falas e o investimento a ser feito, na superfície da factualidade.

(*) Este artigo foi produzido na disciplina Crítica do Jornalismo, que motiva os estudantes a desenvolverem capacidades de leitura crítica sobre os veículos jornalísticos locais. O texto foi elaborado por meio de análise dos portais de notícias na internet do Diário Catarinense e Notícias do Dia, observados no período de 14 a 19 de maio de 2018.