Rafael Spricigo
Acadêmico de Jornalismo na Universidade Federal de Santa Catarina

Este artigo pretende demonstrar por meio de pensamento sistêmico e simplificado como baixos salários estão intimamente conectados à função ética no jornalismo e como esta circunstância repassa prejuízos à população e à própria profissão.

Vamos à pergunta que permeia todo este texto: como um salário baixo pode ser antiético? Para começar minha explicação, gostaria de reafirmar o conceito de que toda matéria jornalística é resultado de um tratamento intelectual da informação, traduzindo em uma única palavra, edição. Firmado este conceito, é preciso concordar que a edição do produto jornalístico começa a ser feita bem antes da confecção da pauta ou da redação em si. O processo de edição começa com a formação intelectual do jornalista.

Por tanto, é extremamente correto afirmar que bons jornalistas carregam grande bagagem cultural e informacional. Ora, e como eles fazem isso? Visto que informação de qualidade é um produto, ela só pode ser adquirida ser for comprada, logo, é preciso de dinheiro. Se não há dinheiro disponível, então não há possibilidade de comprar informação de qualidade. E isso atinge diretamente o profissional.

Um jornalista mal informado já começa sua apuração com “poucas balas no tambor”, conforme uma das máximas que vale também para a área. Seus recursos interpretativos e seus questionamentos são limitados por aquilo que ele conhece. Como resultado disso, o produto resultante também será limitado.

A limitação do jornalista significa a incapacidade de perceber aquilo que não é superficial, de compreender o pano de fundo das situações, de capturar nuances e camadas invisíveis. A limitação é a falta de perspicácia. Já no final da cadeia, o limite do produto é sua falta de novidade, a reafirmação do que já é conhecido e do status quo.

A insuficiência no salário, por sua vez, acaba retardando o aperfeiçoamento dos jornalistas que, como se presume, deveriam ser as pessoas que mais consomem informação. Isto acaba sendo contraditório, já que para um profissional que trabalha utilizando inteiramente sua inteligência, a capacitação intelectual deveria ser sua principal preocupação.

Ao final da cadeia de produção, é o consumidor dos produtos jornalísticos quem sofre com um mar de informações convencionais, pouco atrativas e sem nada que lhe desperte curiosidade e atenção.

É aí que a ética normativa é ferida em seu âmago. A população, que deveria ser incentivada ao debate e ao desenvolvimento da sociedade, recebe, seguidamente, informações de pouco ou quase nenhum valor informacional. Não se despertam novos olhares sobre a realidade, não existe questionamento. O que acontece, então, é a externalização[1] do problema para a sociedade. A empresa midiática repassa o custo que tem com jornalistas (baixos salários) para a população por meio de informação de má qualidade.

Por fim, o sistema acaba voltando para seu ponto de partida. Como o material final acaba recebendo baixa adição de valor devido ao pouco conhecimento do jornalista, o leitor acaba desvalorizando a publicação. Mas não é só isso, ele também acaba atribuindo pouco valor a profissão.


[1] As externalidades (efeitos sobre o exterior) são atividades que envolvem a imposição involuntária de custos ou de benefícios, isto é, que tem efeitos positivos ou negativos sobre terceiros sem que estes tenham oportunidade de o impedir e sem que tenham de pagar ou o direito de ser indenizados.  Quando os efeitos são positivos, então a externalidade é positiva. Quando o efeito é negativo, então a externalidade é negativa. No caso do jornalismo trata-se desta última forma.

Ver: http://www.knoow.net/cienceconempr/economia/externalidades.htm